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OPINIÃO: Dinossauros falantes

Atualizado em 03/10/2025

 

Os dinossauros não falavam. É o que se supõe, já que ninguém jamais viu um vivo. Seus possíveis descendentes, répteis e aves, por exemplo, não falam. Embora alguns cantem. Mas apenas trinados. E só. Entretanto, há entre nós dinossauros que falam. E, muitas vezes, falam impropriedades.

Um desses dinossauros vem dos anos 1980. Na verdade, seria um dinossauro fêmea. Assumida: refratária aos usos e costumes do século XXI – a filósofa Marilena Chauí. Ficou famosa, no mundo das Ciências Sociais, ao lançar um livro de bolso, da coleção “Primeiros passos”, intitulado “O que é ideologia”. Essa coleção, explorando inúmeros conceitos históricos, filosóficos, sociológicos, culturais, etc., supria uma enorme lacuna da Universidade brasileira. E atalhava as discussões: as pessoas se apropriavam de ideias, teorias e ideais variados “pela rama”, de segunda ou terceira mão, via “livrinhos” de bolso, sem a necessidade de se ir aos clássicos. Em rápida incursão pela minha biblioteca, contei 33 volumes dessa coleção da Editora Brasiliense. Fora os extraviados, perdidos, emprestados, etc. Além da “Primeiros passos”, havia a coleção “Tudo é história”. Juntas, perfaziam inúmeros títulos.

Por qual razão estudar as centenas de páginas de “A ideologia alemã”, de Marx (uma de suas obras seminais), correndo o risco de ter que se deparar com Hegel (uma pedreira da filosofia germânica), ou até mesmo com o pré-Socrático Heráclito, “o obscuro” (uma referência da filosofia grega), para melhor entender a ideia de “dialética”, por exemplo? Um conceito central do argumento marxista? Se o “livrinho” da Chauí quebrava o galho? Ainda que a maioria não entendesse muita coisa, dada a confusão do texto e a imaturidade do leitor. Este articulista, por exemplo, demorou mais de dez anos de leitura suplementar para recolocar as ideias no lugar, sobre esse tema. Os clássicos vieram em socorro: e não só os gregos ou os teóricos do Contrato Social. Não devemos nos esquecer de Popper, por exemplo (especialmente, “Conjecturas e refutações”).

O problema dessa pequena (no sentido físico do termo) obra da Chauí seria o mesmo do “Manifesto comunista”, de Marx (igualmente pequeno, com poucas páginas): ambos seriam panfletários. “Mercadejando ilusões”, por assim dizer. “O que é ideologia”, de Chauí, seria pura propaganda, repetindo. E ainda uma “contradictio in terminis”, qual seja, uma contradição em si mesma, como diriam os sábios latinos. Mas muitos viam a obra como uma honesta discussão acadêmica. Nunca foi. A obra propunha um entendimento parcial, político, e partidário, do conceito “ideologia”. Apenas isso.

Há alguns anos, um vídeo de Chauí, ao lado de Lula, viralizou nas redes. A mulher esbravejava, raivosa, gritando: “eu odeio a classe média”. Na última edição de setembro, da Ilustríssima, caderno da Folha Ilustrada, reaparece Chauí, numa entrevista, reiterando seu ódio à classe média e sua ortodoxia marxista: “A classe média funciona oprimindo os dominados e festejando e bajulando os dominantes. Por isso ela é odiosa”. Se diz “marxista para valer”, do tipo ortodoxa. Fala contra o “neoliberalismo” como se fosse uma “praga” a serviço da “direita” liberal (outra doença, aparentemente) e ataca os movimentos identitários: “num momento em que a sociedade brasileira vai numa tentativa de democratização (…) o risco é esses movimentos se tornarem identitários e fragmentarem a sociedade”. Exatamente o que diria Silas Malafaia e a extrema direita fascista. A esquerda representada por Chauí, bem como o bolsonarismo de Malafaia, teriam os mesmos pontos de vista. E os mesmos adversários. Curioso.

Além disso, afirma Chauí: “Eu conservo a ideia de que, sem a determinação econômica e a compreensão de como a sociedade se estrutura em classes antagônicas, não dá para fazer nada”. Eis a velha “luta de classes” e a ortodoxia, criticadas pelos próprios marxistas há quase um século. Eis o “determinante econômico”, a definir os sistemas políticos e jurídicos. Só falta a “mais valia”. Seria impossível explicar a China, por exemplo, a partir desse conjunto conceitual, que fere a realidade. Mas os fatos seriam apenas um detalhe, desse ponto de vista. Pelo visto, o negacionismo não conhece fronteiras.

Bastaria dizer que, segundo essa visão, não existiria conceitualmente a “classe média”. A posição de Chauí seria, como lembra o cancioneiro, “um pote até aqui de …”, contradições. Além de conter muito ódio. Ela odeia o que teoricamente não existe, segundo sua própria “profissão de fé”. Ademais, Chauí, sendo filósofa, se prende apenas a ideias, forjadas por ela própria, “num balé esquisito” (eis o cancioneiro, novamente). Que resistem a qualquer definição da ciência política, ou da sociologia, sem apresentar funcionalidade ou possibilidade de mensuração analítica.

Por exemplo: onde começa, ou termina, a classe média? Como definir a funcionalidade de seus membros, ou sua “consciência de classe”? Como medi-los? Quais seus fundamentos conceituais? Logo, nada disso teria valor metodológico. Seriam apenas sortilégios, “palavras mágicas”, por assim dizer, para enganar bobo.

Mas não façamos como fariam os estudantes de graduação dos anos 1980. Sugiro não aceitar entendimentos “pela rama”, propostos pela própria Chauí. De segunda, ou terceira mão. Vamos aos clássicos. E então poderemos tomar uma atitude em relação a essa senhora: sentar e chorar, por exemplo.

 

Marco Antônio Andere Teixeira – Outubro de 2025.

– Historiador, Advogado e Cientista Político.

 

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