Câmara aprova contas de Sérgio Azevedo após maioria pela rejeição não alcançar votos necessários em Poços de Caldas
Atualizado em 12/12/2025
Foram nove votos pela rejeição e seis pela aprovação; para rejeitar as contas seriam necessários dez votos, o equivalente a dois terços do plenário

A Câmara Municipal de Poços de Caldas aprovou, na noite de quinta-feira (11), as contas referentes aos exercícios de 2018 e 2023 da gestão do ex-prefeito Sérgio Azevedo. A decisão ocorreu mesmo após nove vereadores votarem pela rejeição, número superior aos seis favoráveis. A rejeição, porém, exige dez votos — maioria qualificada de dois terços, conforme determina a legislação. Sem atingir o quórum, as contas foram consideradas aprovadas.
A sessão extraordinária foi marcada por discursos longos, acusações, divergências técnicas e políticas e referências a investigações criminais envolvendo a gestão do ex-prefeito Sérgio Azevedo.
Votaram pela aprovação: Marcos Sansão, Álvaro Cagnani, Ricardo Sabino, Marcus Togni, Wellington Paulista e Kleber Silva.
Votaram pela rejeição: Douglas Dofu, Tiago Braz, Diney Lenon, Tiago Mafra, Lucas Arruda, Pastora Mel, Flavinho, Aliff Jimenes e Neno.
Parecer técnico e posição da Procuradoria
A Comissão de Finanças da Câmara havia indicado problemas nos dois exercícios. No caso de 2023, o principal argumento da defesa do ex-prefeito é que o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) emitiu parecer sugerindo a aprovação das contas, ainda que com ressalvas.
O documento do TCE-MG aponta irregularidades e fragilidades de gestão, recomendando aperfeiçoamento dos controles internos, mudanças administrativas e correções de rumo, mas não sugeriu a rejeição formal das contas.
Durante a sessão, o procurador-geral do município, Thiago Ramalho de Rezende Arantes, reforçou o entendimento técnico do Tribunal de Contas:
“Fica aqui a ênfase, com todo o respeito a opiniões contrárias, com recomendações, aprimoramentos, medidas a serem implementadas, prospectivas, para o futuro, e não olhando para trás.”
Debates e discursos
A seguir, os principais pontos defendidos pelos vereadores:
Flavinho (MDB)
O vereador Flávio Togni de Lima e Silva fez um discurso duro, citando uma série de denúncias vinculadas aos anos 2018 e 2023 e afirmando que a Câmara não poderia “fechar os olhos” para irregularidades.
Ele mencionou a operação da Polícia Civil sobre contrapartidas do Distrito Industrial, denúncia iniciada pela própria Câmara, e afirmou que houve, segundo informações e apurações, envolvimento de servidor em falsificação de documentos e manipulação de recursos. Citou ainda que setores técnicos do Tribunal de Contas identificaram ao menos sete irregularidades, incluindo divergências de planos de trabalho e contratações sem respaldo legal.
Flavinho relatou visita recente à Procuradoria de Crimes de Prefeitos, em Belo Horizonte, que teve como pauta o envio de informações sobre as contas de 2023 e 2024. Ele também destacou o caso da obra executada pelas Águas Minerais Poços de Caldas, que teria sido paga integralmente “sem um único metro de cano instalado”, segundo ele, e que somente foi interrompida por denúncia da Câmara ao Ministério Público.
O parlamentar classificou como “assustador” o modelo de execução de obras em 2023, citando o convênio da secretaria de saúde com a Santa Casa de Salto de Pirapora, quando, segundo ele, obras de pintura, reforma e revitalizações em unidades de saúde teriam sido feitas sem autorização ou fiscalização da Secretaria de Obras. Flavinho disse ainda que a nova administração já identificou indícios de superfaturamento de medicamentos, reforçando que “existem investigações em andamento e provas robustas”.
Ao concluir, afirmou:
“Fechar os olhos pra isso ultrapassa a lealdade política. Se torna conivência e cumplicidade com atos que ainda vão estremecer esta cidade.”
Tiago Mafra (PT)
O vereador apresentou uma análise técnica detalhada, afirmando que as contas de 2023 demonstram “falhas estruturais”, não apenas equívocos pontuais. Segundo ele, houve não observância de requisitos legais, incluindo o uso de fontes incompatíveis com a natureza dos recursos, em desacordo com o artigo 50 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Tiago Mafra destacou que o Tribunal apontou abertura de créditos sem lastro em superávit financeiro, prática que, segundo ele, causa distorções na execução orçamentária. Porém, sua crítica mais contundente foi direcionada à inconsistência entre as demonstrações contábeis apresentadas mensalmente pela Prefeitura e os dados internos:
“A Prefeitura não consegue sequer equiparar seus dados internos. Isso demonstra fragilidade de escrituração, deficiência de controle interno e falta de acompanhamento. Não é um erro isolado.”
Ele afirmou que se trata de um padrão observado ao longo de anos:
“São erros longitudinais, de longa temporalidade. Quem acompanha os pareceres anteriores sabe que essas ressalvas vêm sendo feitas há muitos anos. Não são erros insanáveis, mas são erros persistentes.”
Ao final, reforçou que a votação não se limita ao aspecto técnico:
“Todo voto é político. Se aceitarmos ressalvas contínuas e repetitivas, estaremos normalizando a manutenção dos mesmos problemas.”
Diney Lenon (PT)
O vereador direcionou sua fala principalmente à situação financeira do município e às justificativas que, segundo ele, tentavam amenizar a gravidade apontada nos documentos oficiais. Sobre a afirmação de que “o atual prefeito disse que estava tudo bem com a dívida”, Diney rebateu:
“Não tem ‘falou’, gente, tem documento. A dívida se aproxima de um bilhão de reais. De um lado temos documentos oficiais; do outro, a fala de um afiliado do ex-prefeito.”
Ele criticou a postura de tratar as prestações de contas como algo repetitivo e meramente burocrático:
“O vereador Marcus Togni disse que está aqui há oito mandatos e que todas as prestações de contas são um copia e cola. Então vamos votar num control C control V? É isso que estamos fazendo?”
Diney afirmou que vereadores não podem atuar como defensores pessoais do ex-prefeito:
“Quem não pode passar pano é vereador. O nosso compromisso é com os documentos e com a população.”
Marcus Togni (Republicanos)
O vereador respondeu às críticas afirmando:
“O parecer de vocês, embora brilhante, não foi suficiente para me convencer. O ‘copia e cola’ é apenas o histórico.”
Tiago Braz (Rede)
O vereador apresentou um diagnóstico baseado nos apontamentos do TCE, afirmando que o órgão identificou colapso contábil, caos administrativo, alto risco de violação da Lei de Responsabilidade Fiscal, execução orçamentária distorcida, controle interno falho e rastreabilidade comprometida dos recursos das duas maiores áreas do orçamento: saúde e educação. Em tom didático, afirmou que a análise do TCE revela um cenário de fragilidade sistêmica na administração municipal, muito além de apontamentos pontuais.
Segundo Braz, o Tribunal descreve um conjunto de falhas que, combinadas, formariam um quadro de desorganização generalizada:
“O Tribunal diz que existe um colapso contábil na prestação de contas, um caos administrativo em múltiplos setores, alto risco de violação da Lei de Responsabilidade Fiscal e uma execução orçamentária distorcida e pouco confiável.”
O vereador destacou também que, conforme a análise técnica, os mecanismos internos da Prefeitura seriam incapazes de assegurar a rastreabilidade dos recursos públicos:
“Temos um controle interno falho, permissivo e incapaz de impedir irregularidades. A rastreabilidade dos recursos da saúde e da educação está comprometida — justamente as duas maiores pastas, que concentram quase todo o orçamento.”
Tiago Braz afirmou que, diante desse diagnóstico, não é possível separar avaliação contábil de avaliação política. Para ele, os problemas identificados pelo Tribunal se somam a uma série de fatos ocorridos nos últimos anos da gestão do ex-prefeito Sérgio Azevedo:
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o convênio da saúde com a Santa Casa de Salto de Pirapora, firmado em 2023;
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as doações de áreas no Distrito Industrial via Avança Poços, que resultaram em prisões e delações;
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a obra do Centro Administrativo, hoje investigada por CPI;
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e o projeto ATIVAMENTE, da secretaria de educação, que classificou como “escandaloso” e sem explicação por parte da Prefeitura.
Em sua fala, o vereador sugeriu que o conjunto de elementos investigados aponta para algo mais profundo:
“Os indícios são fortes de corrupção. Os indícios são fortes de que estamos diante de um crime organizado.”
Ele concluiu dizendo que a aprovação das contas, mesmo com nove votos contrários, não encerra o debate, já que há procedimentos em andamento:
“O Ministério Público Federal está pedindo documentos. Há processos abertos para investigar tudo isso. Essa história não se encerra aqui.”
Pastora Mel (União)
A vereadora fez um discurso marcado por tom emocional e críticas diretas aos parlamentares que votaram pela aprovação das contas. Segundo ela, o posicionamento desses vereadores contraria a realidade enfrentada pela população.
Logo no início, a vereadora afirmou:
“Vereadores que vão aprovar, andem de cabeça baixa! O povo quer a realidade, e a realidade é a reprovação!”
Pastora Mel concentrou parte de sua fala em parlamentares ligados à pauta da família e da educação, afirmando que os votos deveriam refletir coerência com os discursos adotados fora do plenário. Dirigindo-se ao vereador Ricardo Sabino, declarou:
“Vereador Ricardo Sabino, você fala que é a favor da família e chega na hora não reprova as contas? Isso é incoerente.”
Ela também mencionou os impactos das decisões administrativas citadas pelos colegas em setores essenciais, como educação infantil:
“Fala isso para a criança sem creche, fala isso para a família!”
Para a vereadora, aprovar as contas mesmo diante dos problemas apontados por outros parlamentares significa ignorar as dificuldades enfrentadas pela população:
“O povo quer a verdade, e a verdade é que essas contas precisam ser reprovadas.”
Lucas Arruda (Rede)
O vereador relacionou diretamente a análise das contas de 2018 e 2023 às dificuldades enfrentadas pela administração municipal no início de 2025. Segundo ele, problemas deixados pelo último ano da gestão do ex-prefeito Sérgio Azevedo impactaram o equilíbrio financeiro e a capacidade operacional do atual governo.
Lucas destacou que foram identificados quase R$ 33 milhões em despesas sem empenho ao término de 2023, o que, segundo ele, comprometeu de forma significativa o orçamento do ano seguinte:
“Só neste ano de 2025, quase 33 milhões de reais foram identificados sem empenho do último exercício, comprometendo sobremaneira o orçamento atual.”
O vereador também criticou a condução da saúde em 2023, marcada pelo convênio firmado com a Santa Casa de Salto de Pirapora. Para ele, a responsabilidade deveria permanecer na Secretaria Municipal:
“A saúde de Poços de Caldas foi entregue para uma OS que não era da nossa cidade. A gestão deve ser da Secretaria de Saúde, não de uma terceirizada. Isso trouxe problemas profundos.”
Lucas afirmou que, apesar da forte comunicação institucional adotada em 2023 para transmitir a sensação de melhoria nos serviços de saúde, a realidade dos atendimentos não condizia com a narrativa:
“Houve um programa de marketing violento para dar a sensação de que os problemas estavam sendo resolvidos. Mas a que custo?”
Como exemplo da situação encontrada, o vereador citou documento oficial da Prefeitura que considerava “natural” a espera de até três anos por uma ressonância magnética:
“Chegamos ao ponto de considerarem natural uma pessoa esperar três anos por uma ressonância. Isso mostra o nível de desorganização que estava instalado.”
Para Lucas, a análise das contas precisa considerar o contexto mais amplo:
“A cidade é robusta, é rica, mas vem enfrentando dificuldades que têm origem clara na forma como a administração anterior encerrou o mandato.”
Resultado
Como apenas nove votos foram registrados pela rejeição — um abaixo do mínimo necessário — a Câmara Municipal aprovou formalmente as contas de 2018 e 2023 da gestão Sérgio Azevedo.
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